quarta-feira, 15 de abril de 2009

Antes louco do que medíocre.

" - Por que é que os homens - gritei - não podem falar de uma coisa sem logo declarar: "Isto é insensato, aquilo é razoável, aqueloutro é bom, isso aí é mau"? De que servem todas essas palavras? Você já conseguiu, graças a elas, penetrar as circunstâncias ocultas de uma ação? (...)
Alberto replicou-me:
- Você há de concordar comigo que certas ações são sempre criminosas, qualquer que seja o seu móvel.
Dei de ombros e acrescentei:
- Todavia, meu caro, ainda neste ponto, há exceções. É verdade que o roubo é um crime, mas o homem que se torna ladrão para salvar-se e salvar aos seus merece a compaixão ou o castigo? (...) Nossos próprios juízes, estes pedantes de coração gelado, deixar-se-iam comover e seriam capazes de suspender o julgamento.
- O caso aqui é completamente diverso. (...) - tornou Alberto.
- Oh! Essa gente razoável! - exclamei eu, sorrindo - Paixão! Embriaguez! Loucura! E vocês se conservam tão calmos, tão indiferentes, vocês, os homens da moral. (...) Tenho-me embriagado mais de uma vez, as minhas paixões roçaram sempre pela loucura e disso não me arrependo, porque só assim cheguei a compreender, numa certa medida, a razão por que, em todos os tempos, sempre foram tratados como ébrios e como loucos os homens extraordinários que realizaram grandes coisas, as coisas que pareciam impossíveis. (...)"

Memórias Sentimentais do Jovem Werther - Goethe.

quinta-feira, 19 de março de 2009

Absurdos e abismos

Absurdos e abismos e a nossa condição.
Nada me falta agora.

O que me mantém acordada são os defeitos do mundo.
No caos, travesseiro.

E radiohead amanhã.
wish away the nightmare

domingo, 7 de setembro de 2008

Descompasso

Quantas idéias são desperdiçadas por dia?
Perdem-se na confusão dos ponteiros que nos deixam com sono, nessa hipnose incessante.

Há um descompasso entre o que sentimos e o que dizemos sentir, entre o que pensamos e o que dizemos pensar: no ritmo, na forma, na velocidade, nas palavras. Assim, por mais sinceros que queiramos ser, seremos sempre um pouco mentirosos.
Minha essência não me corresponde.
Minha verdade é intangível,
intocável,
inaudível,
invisível.
Minha verdade só pode residir em mim, já que ela só é, de fato, verdade enquanto não foi expressa. (Expressá-la é, já, corrompê-la). Somos inevitavelmente artificiais na nossa naturalidade (que absurdo!).
Angústia, parafusos, sinapses. Penso em sinapses? Como podemos assim nos decifrar?
Talvez não possamos. Mas elegemos algo para ser nossa verdade, e nos apegamos a ela. Amo o absoluto para não sofrer com as possibilidades, assustadoras em sua incerteza. Fica mais fácil e simples e precisamos do que é fácil e simples.
Absurdos.
Mistério que habita em nós e se revela nos dias de chuva.
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"Quem já não se perguntou: sou um monstro ou isso é ser uma pessoa?" Clarice Lispector.

Crise kafkiana

Muitas vezes pus de lado meu impulso de escrever, por falta de tempo, por falta de energia, viciosamente consumida num cotidiano desgastante, ou por isso não constituir uma prioridade no momento (e atualmente meu olhar precisa estar inteiramente voltado para as prioridades).
É uma pena. Nunca se sabe dos filhos que ainda vamos ter, por mais que eles passem meses tomando forma e substância dentro de nós. Conhecemo-nos pouco demais para termos uma real noção daquilo de que somos capazes. Talvez exista em nós alguma poesia. Cansada, é verdade, de ser cotidianamente sufocada, mas existente, pulsante, latente.


"Enquanto eu tiver perguntas e não houver respostas continuarei a escrever." Clarice Lispector.

domingo, 31 de agosto de 2008

Rascunho

Não escrevo porque escrevo.
Escrevo porque preciso.
Fluxo de consciência, dessa minha consciência inconstante e voraz, que me devora os ossos, a energia e a voz. Uma consciência que exige ser ouvida, mesmo quando não sabe o que realmente quer dizer. Então ela fala, fala... palavras desconexas, ruído, furacão. Ela fala silêncio e revolução. E me sussurra em ouvido alheio, só pra se fazer sentir. O que ela precisa mesmo é confirmar sua existência impertinente, provar-se para si mesma. Auto-afirmação. Irrita-me. Mas, como dois vermes mutualistas, precisamos uma da outra. Ela sou eu. E em presença dela, estou só. A solidão me permite a companhia de mim mesma. O intransmissível.

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"This time, I'm going to keep me all to myself." Pagan Poetry - Björk.

"Before you count one two three
I will have grown my own private branch
Of this tree." Unison - Björk.

sábado, 15 de setembro de 2007

Escravo de nenhum

"Compreendi que, quando não tinha uma resposta, Guilherme se propunha muitas delas e muito diferentes entre si. Fiquei perplexo.
- Mas então - ousei comentar - ainda estais muito longe da solução.
- Estou pertíssimo - disse Guilherme - mas não sei de qual.
- Então, não tendes uma única resposta para vossas perguntas?
- Adso, se as tivesse ensinaria teologia em Paris.
- Em Paris eles têm sempre a resposta verdadeira?
- Nunca - disse Guilherme - mas são muito seguros de seus erros.
- E vós - disse eu, com impertinência infantil - nunca cometeis erros?
- Freqüentemente - respondeu. - mas ao invés de conceber um único erro, imagino muitos. Assim não me torno escravo de nenhum."
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O nome da rosa, de Umberto Eco.
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"Teme, Adso, os profetas e os que estão dispostos a morrer pela verdade. (....) Talvez a tarefa de quem ama os homens seja fazer rir da verdade, fazer rir a verdade, porque a única verdade é aprendermos a nos libertarmos da paixão insana pela verdade."

segunda-feira, 13 de agosto de 2007

O Lula e o Aranha

Algo que me marcou muito, ainda na infância, quando eu costumava assistir muito ao Homem-aranha, foi uma coisa que o tio Ben disse para Peter Parker: “Grandes poderes exigem grandes responsabilidades”. Isso repercutiu intensamente na forma como o Aranha encarava a vida, e foi o que determinou que ele se tornasse um super-herói e não um super-vilão.

O que acontece frequentemente, quando não há alguma frase imponente como esta ecoando em nossa consciência ou não temos uma índole tão bem estruturada como parece ser a dos grandes heróis da ficção, é que usemos o poder para benefício próprio.

O poder deslumbra, o poder fascina e cega. É capaz de enfraquecer ideologias, desestruturar propostas e transformar pessoas em pacotes de hipocrisia. Ao longo da história, recorrentes são os casos de ideais traídos e revoluções minadas ao menor contato de seus líderes com o tão perigoso poder.

Parece-me, no entanto, que estamos vivendo mais um destes casos. O que é uma pena porque mostra o quão pouco nós aprendemos com a história. O ex-metalúrgico, ex-líder sindical e atual presidente da República vem decepcionando profundamente aqueles que o concederam o poder. E não foi uma aranha geneticamente modificada, fomos nós, o povo brasileiro.

Digo isto porque, diferentemente da aranha em relação a Peter Parker, nós depositamos expectativas no governo Lula, esperávamos que ele tivesse uma postura diferenciada com a população, porque tínhamos necessidades urgentes.

Tais necessidades não foram atendidas, e o que vemos é o colapso generalizado de diversas instituições. Depois dos comentários dos políticos que mais parecem boas piadas, o que mais ouvimos nos jornais é a palavra ‘apagão’. Apagão aéreo, apagão da educação, apagão da saúde, apagão moral.

Lula era um herói em potencial, hoje é uma potência em frustração. Teve uma chance, está tendo agora a segunda. Ele se propôs a ser um herói, discursou como um herói nas inúmeras eleições em que foi candidato à presidência. Assumiu, pois, o poder, mas não está assumindo suas responsabilidades.

E, como eu já disse, este é um problema antigo, apesar de atual. Problema recorrente na política brasileira, como deixa transparecer Darcy Ribeiro, ainda em meados da década de 70: “Nada é mais continuado, tampouco é tão permanente, do que essa classe dirigente exógena e infiel ao seu povo”.

Talvez seja a hora de nós, brasileiros, seguirmos o exemplo do tio Ben e tentarmos mostrar para Lula que precisamos de alguém que nos represente, que use seu poder para nos ajudar, o que aliás, não seria caridade, mas a obrigação de um presidente. Alguém que assuma o ônus e o bônus. Mais do que tudo, alguém que se assuma.